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Pires e Albuquerque – e o Ministério Público

Se um dos jovens de hoje, que serão os juristas de amanhã, perguntar a um dos nossos contemporâneos quem foi o Ministro Antônio Pires e Albuquerque, ouvirá que ele foi um dos expoentes do foro do seu tempo.

Primeiro como juiz singular, depois como ministro do Supremo e afinal, durante onze anos como procurador-geral da República, Pires e Albuquerque evidenciou as qualidades de que eram formados sua inteligência e seu caráter. O caráter era límpido, coerente e inquebrantável, formado como um cristal sob o império de leis morfológicas, que lhe determinavam, sem desvio possível, a concordância dos planos e a contraposição dos ângulos. Obedecia a uma lógica impecável em suas atitudes. Nelas, nada aspirava à transação ou ao meio-termo. Uma repugnância instintiva à dubiedade ou à incoerência brotavam do fundo de sua constituição moral e física, e, de tal modo impregnaram sua personalidade, que nele obliteraram outras qualidades, não menos dignas de apreço, mas de característica distinta: o dom conciliatório, a finura diplomática para conduzir a bom termo um debate ou uma negociação.

Do mesmo modo que o caráter, era definida e marcada a sua inteligência. Foi ele, sem dúvida possível, um dos talentos da sua geração, e não só na sua, mas em todas as épocas, ele avultará pela potência do raciocínio e pelo brilho da eloquência. Sua inteligência era definida e inconfundível. O traço que se salientava era talvez aquele que mais convém ao jurista, sobretudo ao magistrado: o dom de enquadrar e solucionar problemas. Toda controvérsia, por mais obscura, ao passar pelo seu espírito prismático, se analisava, e decompunha. No emaranhado de um problema sabia encontrar, sem esforço, a ponta do fio que o desatava. O tempo, que outros perdem em digressões, não raro eruditas e úteis, ou na análise de questões sem influência direta sobre a solução da controvérsia, não era malbaratado nos seus estudos, sempre conduzidos pelo princípio da essencialidade, vale dizer, da simplificação.

Sua inteligência bem dotada para separar o essencial do acessório, o necessário do supérfluo, o útil do ornamental, tinha uma natural imunização para as confusões e os enganos oriundos do verbalismo. Era, portanto, em suma, um espírito claro, mais propenso a decidir do que a hesitar, premunido contra as seduções do pensamento discursivo, e pronto a cortar pelo atalho mais curto os caminhos longos e fastidiosos, em que se comprazem os amantes de discussões.

 

 

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