Discurso proferido na sessão magna de 25 de outubro de 1941, comemorativa do cinquentenário da Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, em nome da Congregação de Professores.
São os aniversários ocasiões propícias à meditação e ao julgamento de si mesmo. As instituições que envelhecem — como os homens — fazem nestas grandes datas uma pausa no tumulto das seus dias, e recolhem o olhar pousado nas tarefas externas, para concentrar a consciência no exame do seu próprio destino.
Hoje completa o seu cinquentenário a nossa jovem e gloriosa Academia. E se por um dia se suspende o nosso labor, é para que possamos, reunidos nesta doutoral, meditar sobre o destino da instituição viva que com os nossos alunos encarnamos, e não só sobre o seu destino cumprido, como sobre o seu destino a cumprir, procurando através dele conhecer o sentido, o útil e o inútil das nossas próprias existências.
Num mundo que se transforma tumultuosamente, não só nas formas aparentes como em toda a sua ordem fundamental de valores, o espírito humano vive num perpétuo examinar-se.
Nenhum estudo, nenhum ideal, nenhum programa; nenhum organismo, profissão ou atividade, está bem justificado aos nossos olhos se não o sentimos radicado no futuro, se não podemos ter os sinais e a garantia da sua sobrevivência às transformações que passam.
Essa inquietação com o destino — próximo e distante — das coisas e das ideias, esse temor dos compromissos com valores efêmeros, é por certo um dos aspectos dramáticos e, ao mesmo tempo, fecundos do espírito moderno. Toda cultura aspira a durar. Pode dizer-se mesmo que a cultura não é senão um esforço para vencer as contingências do tempo e instaurar uma ordem que sobreviva à marcha incessante da história, que domine e absorva o novo dos acontecimentos. Quanto maiores, quanto mais rápidas, quanto mais vastas são as mudanças, quanto mais velozmente se transformam as sociedades e os homens, mais se exaspera, no plano da cultura, a ânsia de durar; e indagar pelo destino de cada instituição, de cada sistema, de cada coisa, torna-se o problema capital a que inelutavelmente volvemos nas horas em que o nosso espírito se recolhe para meditar.
Estamos aqui debruçados sobre o passado da nossa Faculdade, e como impedir que o nosso espírito todo se absorva em perscrutar o seu futuro?
É certo que encontramos nas tradições, mesmo tênues, da nossa casa, um elo poderoso que nos prende, e nutre a nossa convivência intelectual. Uma hora como esta dá lugar a meditações graves, mas também sugere a evocação comovida daqueles que deixaram impresso o seu vulto na memória dos seus discípulos de ontem, colegas de hoje, e retirando-se pela morte, pelo apelo de outros postos, ou pela idade, a eles legaram o encargo de manter as cátedras que ilustraram.
Quero render-lhes a homenagem que no dia de hoje transborda dos nossos peitos; seus grandes nomes são as nossas glórias, seus pensamentos e livros são os episódios culminantes da nossa história externa, os gestos e palavras que deles nos ficaram são a crônica doméstica.